segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O feminismo engajado da Marcha Mundial das Mulheres

Luis Nassif Online6 de janeiro de 2011 às 15:59h

No bojo do Fórum Social Mundial, movimento feminista internacional, apoiado pela internet, aparece como um dos principais do mundo

Um dos fenômenos mais relevantes da globalização foi o da internacionalização dos movimentos sociais. Algo similar ocorreu após a revolução russa em 1916, mas de uma forma centralizada, muitas vezes desrespeitando as condições e características de cada país.

Desta vez, no bojo do Fórum Social Mundial, proliferaram inúmeras organizações adaptadas aos novos tempos, em que a influência da Internet, do chamado trabalho em rede, abriram espaço para as chamadas organizações horizontais – no máximo sob uma coordenação geral, mas sem a centralização dos velhos movimentos.

Um desses movimentos é a Marcha Mundial das Mulheres, responsável por alguns eventos de repercussão no país, e que se tornou a face mais legítima do movimento feminista – porque voltado para trabalho efetivo contra a exclusão das mulheres, mas sem perder de vista as lutas gerais por inclusão social.

Atualmente, o MMM está organizado em 55 países, com ações regionais em 76.

Foi criado em 1995 em Quebec, Canadá, como uma reação ao acordo da ALCA e quando se percebeu que seria difícil manter conquistas sociais restritas a cada país isoladamente. O tiro de partida foi dado pela Federação das Mulheres de Quebec.

Gradativamente o movimento se espalhou por outros países, estruturando-se em torno de três pontos específicos.

Primeiro, atuar sob coordenações nacionais, de forma horizontal, sem comandos centralizados e tomando decisões por consenso.

Segunda, ser integrante da grande frente do Fórum Social Mundial.

Terceiro, a cada cinco anos montar ações próprias mundiais da Marcha em torno de quatro bandeiras específicas:

1. Autonomia econômica das mulheres;

2. contra a violência;

3. pela paz e desmilitarização;

4. pelo bem comum e contra privatização da natureza e dos serviços públicos.

A evolução das bandeiras

No primeiro encontro em Montreal, em 1998, o movimento estruturou uma marcha mundial das mulheres contra a pobreza. Em 2000, outra manifestação global contra o estupro na guerra da Bósnia, quando conseguiram mais de 5 milhões de assinaturas de apoio. Depois, manifestação em Nova York, solicitando audiência no Banco Mundial e no FMI, entregando as assinaturas à ONU (Organização das Nações Unidas).

A partir das bandeiras de paz e desmilitarização, passou a olhar outros ângulos da globalização, como o deslocamento de populações afetando a autonomia econômica das mulheres. E também os efeitos diretos da guerra, como a prostituição no entorno das bases militares.

Em protesto, montaram ações na base militar dos Estados Unidos nas Filipinas. Também montaram visitas de solidariedades às comunidades mais afetadas por conflitos armados, como movimentos de camponeses e de afro descendentes.

O movimento atua de forma horizontal, com cada unidade tendo ação autônoma e sendo representada em um Comitê Internacional, composto por duas representantes por região: Ásia, Paquistão, Filipinas, África, Europa, Américas. O Secretariado Internacional é coordenado por uma brasileira.

Em cada país, pessoas de referência mandam informações. As decisões precisam ser tomadas por consenso. Se alguma região do mundo votar contra, a decisão é suspensa.

O feminismo includente

A MMM começou no Brasil em um encontro preliminar em 1998 e um encontro nacional em 1999.

A Coordenação Executiva tem representantes de várias organizações feministas, como a SempreViva Organização Feminista, Centro Feminista 8 de Março, Secretaria de Mulheres da CUT e da CONTAG, representação de jovens da Marcha.,

Assim como em nível mundial, por aqui funciona com comitês estaduais e desenvolvendo uma agenda própria, paralela à agenda internacional, com informações captadas de estados e municípios e decisões sendo por consenso.

Em 8 de março de 2005 juntaram 30 mil mulheres para o lançamento da Segunda Ação Internacional da Marcha. Na terceira ação, no ano passado, colocaram 3 mil mulheres em dez dias de caminhada entre Campinas e São Paulo, com estrutura de cozinha, segurança na estrada, relações com meios de comunicação, atividades de formação política.

Não se trata de um feminismo deslocado dos demais grupos oprimidos, ao contrário do que ocorre com facções feministas mais ligadas à área acadêmica.

Defendem diversidade de mulheres: jovens, lésbicas, negras, urbanas, rurais, sindicalistas, indígenas. É um feminismo de resultado, onde cabem todas as mulheres e preservam-se as diferenças culturais entre os diversos países.

Por exemplo, em um primeiro momento a legalização do aborto não aparecia na pauta comum. Depois, o tema foi tirado das discussões preliminares, mas mantido em suspenso at~e se chegar a um consenso. Isso porque o acordo precisaria ser firmado entre países de culturas distintas.

Nas discussões, evitam colocar uma agenda feminista priporitária. As discussões conduzem a acordos e campos de ação, para evitar que uma prioridade seja colocada na frente de outra.

O campo de atuação também não se restringe ao movimento feminista. Há alianças estratégicas n apenas com o Fórum Social Mundial, mas com a Assembléia dos Movimentos Sociais (agenda comum) e Agenda de Trabalho com Via Campesina e Amigos da Terra Internacional.

Por conta disso, acabam sofrendo discriminações no próprio meio, especialmente de facções feministas que se consideram mais elitizadas.

Foi o caso de uma transmissão de movimentos sociais pela Internet, na qual os organizadores receberam pedido do blogueiro Idelber Avelar para excluir a MMM, por serem consideradas por ele como “intelectualmente toscas”.

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