“a história é um carro alegre, cheio de um povo contente,
que atropela indiferente todo aquele que a negue...”.
(Chico Buarque e Pablo Milanês)
Na pesquisa Vox Populi, divulgada em 25 de julho, a vantagem de Dilma sobre Serra no meio urbano é de 4 pontos percentuais (43 X 39); no rural a vantagem é de 25 pontos (55 X 30). Na pesquisa Sensus, do período 31 de julho a 2 de agosto, divulgada pela Confederação Nacional dos Transportes, a história se repete. A vantagem de Dilma no urbano é de 7,6 pontos (39,9 X 32,3) e no rural é de 24 pontos (51,2 X 27,2). Mais: nesta mesma pesquisa o Governo Lula tem 79,3% de aprovação no meio urbano e 87% no rural. O índice de desaprovação ao governo no urbano é de 15,1%, enquanto no rural é de 10%.
Ou seja, estamos muito bem no meio rural, aquele mesmo que historicamente sempre nos pareceu refratário às propostas da esquerda e que sempre foi visto, com razão, como território eleitoral dos partidos conservadores. Quem vive e trabalha no campo aprova o Governo Federal e quer continuidade. Ficou difícil continuar afirmando que não fizemos nada ou muito pouco. Aos mais céticos talvez valha a pena tentar entender porque tem tanta gente satisfeita com nossos programas. A menos que prefiram a máxima de que “o povo não sabe votar e não entende de política”. A seguir algumas pistas para tentar compreender este povo que – aposto! – é sábio:
1) Reconhecemos a diversidade do meio rural e de caminhos para o seu desenvolvimento. Ouvimos a voz e defendemos direitos a outras populações que estavam condenadas a invisibilidade: sem terra, agricultores familiares, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, quebradeiras de coco, varzeteiros, indígenas e quilombolas;
2) Contribuímos para democratizar o acesso a terra. Em sete anos o Governo assentou 574,6 mil famílias. Isto significa 59% do total das famílias assentadas em toda a história do país. Foram 46 milhões de hectares de terra destinados para a Reforma Agrária (53% do total de terras destinadas para a Reforma agrária em toda a história do país e uma área maior que o estado de São Paulo e Paraná). E, ainda, 74 mil famílias conseguiram acessar a terra via o crédito fundiário.
3) Garantimos o direito à terra com a regularização de 134 mil posses (Ceará, Piauí, Minas Gerais etc), dos territórios de 82 comunidades quilombolas, beneficiando 4.217 famílias com a emissão de 60 títulos numa área total de 174,4 mil hectares.
4) Fortalecemos a agricultura familiar: Mais de um milhão de famílias foram incorporadas ao sistema de crédito agrícola ( PRONAF), especialmente no norte e nordeste do país. O volume de crédito passou de minguados R$ 2,4 bilhões em 2003 para R$ 16 bilhões em 2010. Com o Seguro Agrícola de clima e de preços, que já beneficiam mais de 2,5 milhões de famílias, não há mais o risco do endividamento.
5) Garantimos mais mercado e mais renda para a agricultura familiar. O Programa Mais Alimentos permitiu a aquisição, nos últimos dois anos, de 30 mil novos tratores (de 1996 a 2006, em 10 anos somente 7,2 mil estabelecimentos tinham conseguido comprar um trator). O Programa de Aquisição de Alimentos – PAA já beneficiou 764 mil famílias, com investimentos de R$ 2,7 bilhões, adquirindo a preço justo quase 2 milhões de toneladas de alimentos. O PAA Leite organizou a cadeia produtiva do leite no nordeste, aumentado e regularizando a oferta e melhorando o preço pago aos agricultores.
6) Agora podemos ter uma alimentação escolar com produtos de qualidade da própria região. Este ano começou a vigorar a Lei da Alimentação Escolar que determina que pelo menos 30% dos recursos da alimentação escolar deverão ser gastos na compra direta de alimentos da agricultura familiar. Isto representa uma reserva de mercado de mais de R$ 1 bilhão, incentivo para o desenvolvimento local e mais saúde para as crianças.
7) O Programa Nacional de Biodiesel já incorporou na cadeia produtiva 54 mil famílias, nas regiões mais empobrecidas do país, com uma receita média em 2009 de R$ 9 mil por família. Em 2010, as compras de matéria prima da agricultura familiar chegarão a R$ 1,1 bilhão. A Petrobrás Biocombustíveis, além de ofertar assistência técnica, correção de solos e sementes, estabelece contratos de compra da produção de oleaginosas por um prazo de cinco anos a preços justos.
8) Apostamos na autonomia econômica para garantir a igualdade das mulheres rurais. Mais de 550 mil mulheres foram beneficiadas com a emissão de documentos - CPF, RG, Carteira de Trabalho, Registro de Nascimento; com a titulação conjunta obrigatória da terra na reforma agrária as mulheres titulares de lote já são 56%. O Pronaf Mulher já beneficiou 37 mil projetos exclusivos e de 2003 a 2008 foram 1,9 milhões de operações de crédito tendo as mulheres como titulares.
9) Apostamos no desenvolvimento das regiões. De forma inédita as políticas agrícolas, de educação, saúde, cultura e seguridade social começam a chegar ao mesmo tempo. O Programa Territórios da Cidadania coordena e integra políticas públicas de 22 ministérios e estados em 120 territórios (1.852 municípios) com a alocação de mais de R$ 27 bilhões em 2010.
Os resultados estão aí. De 2003 a 2008 a renda da Agricultura Familiar cresceu 30% acima da inflação, enquanto a média do país foi de 11%. Neste mesmo período, 4,8 milhões de pessoas saíram das condições de pobreza no meio rural. Nos últimos anos surgiram novas 412 mil propriedades da agricultura familiar no país. Ou seja, estamos invertendo a tendência de êxodo rural. Com crédito, assistência técnica, seguro e política de preços, a agricultura familiar e os assentados da reforma agrária passaram a produzir 70% de tudo aquilo que os brasileiros consomem no dia-a-dia.
Na contramão desta transformação democrática, o candidato José Serra recentemente defendeu o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário e a unificação da Política Rural em único órgão. Vale dizer, o fim de políticas próprias e distintas para a agricultura familiar e para a reforma agrária, motor destas mudanças.
O que fica claro é que estas eleições apresentam opções muito diferentes e com enormes conseqüências para o meio rural. O aprofundamento do caminho atual com Dilma ou um radical retrocesso com Serra.
A julgar pelas pesquisas o meio rural brasileiro já percebeu isto e já fez sua opção. Como sempre acontece, é o povo que escreve o melhor da história. E mais uma vez o nosso povo – mulheres e homens camponeses, agricultores familiares, assentados, populações tradicionais, trabalhadores rurais – mostra-nos que sabe comemorar conquistas e continuar lutando.
Uma lição de lucidez e persistência.
Guilherme Cassel, PT (RS), é ministro do Desenvolvimento Agrário.
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