A situação econômica europeia deve continuar piorando por algum tempo ainda antes de se estabilizar. O presidente do Banco Central Europeu qualificou a situação atual da zona do euro como “dramática” e a pior vivida desde a Primeira Guerra Mundial!
Eduardo Mancuso *
Não é para menos: tanto o “plano de resgate” da Grécia de 110 bilhões de euros, como a criação do fundo europeu de quase um trilhão de dólares, que custaram longas negociações aos países da União Europeia e mobilizaram recursos do Fundo Monetário Internacional, parecem não ter sido suficientes para “restabelecer a confiança dos mercados”.
Além da queda do euro e da crise do chamado PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), existe o risco de recaída da economia européia na recessão, pois o desemprego recorde atual (a Espanha alcançou impressionantes 20%) e a histeria dos mercados com o aumento dos déficits públicos da região, exigindo políticas de ajuste antissociais dos governos, podem tornar isso uma realidade. E o pior que pode acontecer com a Europa é não sair da recessão e seguir o exemplo do Japão, que tem sua economia estagnada desde os anos 1990. Isso poderia realmente ameaçar a continuidade do euro e colocar em cheque as bases do projeto de integração da União Europeia.
A resistência necessária
Em plena recessão mundial, o FMI pede aos governos das economias europeias que enfrentem seus déficits públicos, o que já começa a ser concretizado com o brutal “plano de resgate” na Grécia, seguido de duros ajustes na Espanha e Portugal, enquanto a Itália já sinaliza estar cumprindo a sua “lição de casa”. Os planos são praticamente iguais, pois têm a mesma matriz e sentido de classe: ataque aos trabalhadores dos setores público e privado, cortes nas aposentadorias, nos investimentos e nos gastos sociais. Os resultados previsíveis apontam para o aumento do desemprego (que já se encontra em níveis recordes na Europa), empobrecimento e perda de poder de compra da população trabalhadora e estagnação econômica.
Esse quadro já está levando a mobilizações sociais e resistência dos trabalhadores nas ruas das cidades européias. O paradoxo da ortodoxia neoliberal é o de impedir a recuperação econômica e, portanto, a melhoria das contas públicas, o que, naturalmente, não irá “tranqüilizar os mercados”, que vão continuar pressionando (e desestabilizando) os mesmos governos que os salvaram com a intervenção coordenada durante a crise aguda e o quase colapso do sistema financeiro mundial há pouco mais de um ano, ao custo de trilhões de euros.
Enquanto isso, as agências de classificação de risco rebaixam a qualificação de grandes bancos gregos e ameaçam rebaixar a qualificação das dívidas soberanas de outros países. Também preveem um panorama pessimista para o futuro do euro, agravando ainda mais a crise financeira instalada na União Europeia. Parece que a soberania dos países da Europa não é mais respeitada pelos mesmos “mercados” que foram salvos do dilúvio pelos respectivos Estados.
A política dos governos é jogar o custo da crise em cima da população e terá o efeito de impedir a recuperação econômica da Europa. Cabe aos trabalhadores e a sociedade europeia resistir a isso e lutar para que o custo da crise seja pago pelos seus responsáveis diretos: o grande capital e os mercados financeiros. A chave para superar a crise passa pela construção de um verdadeiro projeto de integração dos povos e dos territórios: uma Europa social, solidária e sustentável.
Grécia
A União Européia (UE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), com a submissão do governo social-democrata grego e diante do rápido agravamento da crise na zona do euro, acordaram um empréstimo de 110 bilhões de euros (depois de muitas idas e vindas e tendo que superar fortes resistências do governo alemão) para a Grécia honrar pagamentos de curto prazo da sua imensa dívida aos principais credores (bancos europeus), cuja contrapartida vai golpear duramente os trabalhadores e aposentados e empobrecer a população do país mediterrâneo.
O “plano de resgate” da Grécia imposto pela UE com o aval do FMI está integralmente dirigido ao pagamento dos grandes credores financeiros, isto é, não haverá um único euro de investimento social ou destinado a ajudar de fato a recuperação da economia grega. Além disso, as taxas de juro cobradas são da ordem de 5%, o que, para os padrões internacionais, constitui uma excelente rentabilidade, e com a segurança do retorno garantida pelas condições draconianas impostas aos gregos, que já estão nas ruas para impedir esse programa antissocial. Isso tudo diz muito em relação ao nível de solidariedade da integração europeia.
O severo plano de austeridade imposto à Grécia, com a concordância do governo e do parlamento, implica em cortes dos gastos públicos de 30 bilhões de euros nos próximos três anos, com reduções salariais, reforma trabalhista para facilitar as demissões ao setor privado, corte nas aposentadorias e reforma do sistema previdenciário, além de forte aumento dos impostos indiretos. Trata-se de uma perversa combinação de ataques a direitos sociais com diminuição do consumo e empobrecimento da população trabalhadora.
Evidentemente, esse plano de “resgate” da Grécia (na verdade, dos credores) aprofundará a crise econômica do país e prolongará a recessão por muitos anos. É escandaloso o contraste com a política dos governos europeus ainda no ano passado, quando injetaram centenas de bilhões de euros nos grandes bancos sem nenhuma exigência e nem ao menos avançarem algum nível de regulamentação sobre o mercado financeiro. Já para um país periférico da União Europeia como a Grécia são impostas condições que significarão forte queda nas condições de vida e de trabalho de milhões de cidadãos europeus.
Diante dessa situação só a mobilização social, as lutas e as manifestações nas ruas da capital Atenas e das outras cidades do país mediterrâneo convocadas por sindicatos e forças políticas de esquerda, pode defender os interesses básicos do povo grego.
* Eduardo Mancuso é editor da seção internacional do jornal Democracia Socialista/Em Tempo. É assessor de cooperação internacional da Prefeitura de Canoas/RS e integrante do comitê gaúcho do Fórum Social Mundial.
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